Já está comprovado que algumas enfermidades e o risco de doenças não transmissíveis, como diabetes, doenças cardiovasculares e câncer, está diretamente relacionado à dieta pobre em nutrientes e à obesidade, quando associadas ao consumo de alimentos ultraprocessados, de acordo com uma pesquisa desenvolvida pelo Nupens (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde).
O estudo teve como objetivo estimar mortes prematuras atribuíveis ao consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil.
São alimentos ultraprocessados pães e bolos industrializados, salgadinhos de pacote, refrigerantes, bebidas adoçadas, macarrão instantâneo, pizzas congeladas, sorvetes, biscoitos recheados, balas, doces, chocolate etc.
Em 2019, a prevalência de sobrepeso e obesidade entre os brasileiros era de 53,8%
O estudo concluiu que o consumo de alimentos ultraprocessados representa uma causa significativa de morte prematura no Brasil.
A redução da ingestão de alimentos ultraprocessados promoveria ganhos substanciais na saúde da população e deveria ser uma prioridade da política alimentar para reduzir a mortalidade prematura
Poucos governos dão prioridade à saúde em detrimento das grandes empresas. Tal como aprendemos com a experiência da indústria do tabaco, uma empresa poderosa pode vender ao público praticamente qualquer coisa.
A produção de ultraprocessados impacta na biodiversidade
No documentário Campo e Sustentabilidade 2 – O amanhã é hoje (2022) que faz parte do acervo do portal É conosco, o professor Carlos Augusto Monteiro do Depto. de Nutrição FSP|USP nos explicou o impacto que a produção (e consumo) dos alimentos ultraprocessados causa na biodiversidade, pelo fato de buscarem seus ingredientes basicamente em apenas quatro ou cinco espécies vegetais (soja, trigo, milho, cana de açúcar), por serem as mais produtivas.
Outra pesquisa brasileira (Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em parceria com o NUPENS identificou que aditivos cosméticos como sódio, gorduras e açúcares, estão em 82,1% dos alimentos ultraprocessados e nutrientes críticos, usados para realçar a cor, o sabor ou a textura, em 97,1% deles.
Os alimentos ultraprocessados estão ganhando cada vez mais peso no cenário alimentar global
A relação entre o sistema alimentar e o rápido aumento mundial da obesidade e doenças relacionadas ainda não é bem compreendida.
Muitas formas de processamento de alimentos são benéficas. A utilização do fogo e do sal para preparar e cozinhar os alimentos, e do desenvolvimento de métodos de conservação, possibilitaram a evolução, adaptação e aumento da humanidade e das populações assentadas.
O problema ganhou maior dimensão a partir da década de 1980, com a aceleração das técnicas da ciência alimentar avançamos para um processo denominado ultra processamento, que permitiu a invenção de uma vasta gama de produtos atrativos, saborosos, baratos, prontos para consumir e feitos a partir de ingredientes e aditivos baratos.
O sistema alimentar global foi dominado por produtos processados e prontos para consumo
Atualmente, quem dita o rumo do sistema alimentar no mundo são as corporações transnacionais que e se transformaram em gigantes corporativos, envolvidas na produção de alimentos, varejo e serviços de fast food. Seus negócios são predominantemente centrados em produtos ultraprocessados altamente rentáveis, com grandes verbas de publicidade e marketing estimulando o consumo.
Existindo para dar lucro, não para alimentar
O volume de negócios anual de algumas empresas transnacionais de produção, por vezes conhecidas coletivamente como Big Food, Big Soda e Big Snack, está ao nível do produto nacional bruto dos países de dimensão média.
O “Joio e o trigo”, portal de jornalismo investigativo sobre alimentação, saúde e poder, se posicionou considerando que ultraprocessados são produtos, antes de serem alimentos e têm como principal razão de ser a lucratividade, e não a nutrição.
Essas transformações têm sido acompanhadas por um dramático aumento da obesidade.
Ambientes que promovem ou facilitam escolhas alimentares não saudáveis e comportamentos sedentários, dificultam a adoção e manutenção de hábitos alimentares saudáveis e a prática regular de atividade física.
Se o que é consumido mudou, mudaram também as formas de consumo (para pior)
À medida que as sociedades se tornam mais urbanizadas, que a renda média aumenta e também aumenta a proporção de mulheres empregadas fora de casa, os produtos alimentares prontos para consumir tornam-se escolhas convenientes e atrativas.
Os alimentos e ingredientes culinários, as chamadas “comida de verdade”, são principalmente preparados e consumidos como refeições, geralmente em horários regulares e normalmente em locais específicos.
Os produtos ultraprocessados são consumidos principalmente como lanches, quase a qualquer hora e em qualquer lugar. Até a segunda metade do século XX, poucos adultos consumiam lanches. Mas agora, em países como os Estados Unidos, Canadá, México, Brasil e China, os produtos em forma de lanche representam até um quarto de todas as calorias consumidas.
Ainda no documentário Campo e Sustentabilidade 2, a professora Maria Laura Louzada, Pesquisadora NUPENS|USP, explica que os efeitos dos alimentos no nosso corpo não dependem apenas da soma dos nutrientes, mas também a forma como comemos.
As características físicas do lugar onde comemos (se estamos a mesa ou de pé, ou ainda no carro), se tem pessoas nos acompanhando, toda a ambiência tem impacto na quantidade e na qualidade do que comemos.
Só existe opção quando se tem informação
A partir de outubro de 2022, os novos produtos já devem sair de fábrica com os rótulos, adequados às novas regras sobre produtos com altos índices de açúcar adicionado, gordura saturada e sódio, estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O objetivo é melhorar a clareza e legibilidade dos rótulos dos alimentos e auxiliar o consumidor a fazer escolhas alimentares mais conscientes.
Foram seis anos de discussões, marcados por disputas entre os representantes da indústria e os defensores dos direitos do consumidor.
A conscientização dos consumidores passa por legislações que orientem para a escolha de produtos mais saudáveis e ética na produção de alimentos, tratando as pessoas mais como cidadãos do que como consumidores
Saber o que comemos é o que nos leva a fazer melhores escolhas na alimentação. A partir do momento que as pessoas comem melhor, elas vivem melhor. E isso tem um impacto enorme no sistema de saúde.
Direito humano à alimentação adequada
A Organização Mundial da Saúde (OMS), propõe que os governos forneçam informações à população para facilitar a adoção de escolhas alimentares mais saudáveis em uma linguagem que seja compreendida por todas as pessoas e que leve em conta a cultura local.
O Guia Alimentar para a População Brasileira cumpre este papel e tem por pressupostos os direitos à saúde e à alimentação adequada e saudável, e é um documento oficial que aborda os princípios e as recomendações de uma alimentação adequada e saudável para a população brasileira.
Ser saudável é uma escolha - Siga os dez passos para uma alimentação adequada e saudável
1) Fazer de alimentos in natura ou minimamente processados a base da alimentação.
2) Utilizar óleos, gorduras, sal e açúcar em pequenas quantidades ao temperar e cozinhar alimentos e criar preparações culinárias.
3) Limitar o consumo de alimentos processados.
4) Evitar o consumo de alimentos ultraprocessados.
5) Comer com regularidade e atenção, em ambientes apropriados e, sempre que possível, com companhia.
6) Fazer compras em locais que ofertem variedades de alimentos in natura ou minimamente processados.
7) Desenvolver, exercitar e partilhar habilidades culinárias.
8) Planejar o uso do tempo para dar à alimentação o espaço que ela merece.
9) Dar preferência, quando fora de casa, a locais que servem refeições feitas na hora.
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